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“Investimento: a última arte liberal” 

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O livro Investimento: a última arte liberal, publicado no Brasil pela LVM Editora, inspira-se nas palestras de Charlie Munger, o vice-presidente da Berkshire Hathaway — companhia mais conhecida por seu CEO, Warren Buffet. Seu autor é Robert G. Hagstrom, investidor sênior norte-americano.

O livro, segundo o próprio autor, não é um manual de escolha de ações ou administração de um portfolio, mas a apresentação de uma nova forma de pensar investimentos e entender como mercados funcionam. A obra resgata conhecimentos derivados de uma educação liberal clássica — negligenciada em nossos tempos — e sugere como podemos conectá-los.

Treliça de Modelos Mentais

“Você deve ter modelos em sua cabeça, e deve organizar essas experiências — diretas e de terceiros — nesta treliça de modelos.” – Charlie Munger

Munger cunhou o conceito de “treliça de modelos mentais” como uma metáfora para sustentar a importância de se ter uma visão mais ampla da “sabedoria mundana”. Nessa visão, cada disciplina se entrelaça a todas as outras, fortalecendo-as no processo. Assim, cada uma fornece um modelo mental — ou ideias-chave — que, combinados, produzem uma compreensão coesa do mundo.

Não se trata de virar um especialista em diversas áreas do conhecimento, mas de assimilar os princípios fundamentais e pensar de forma associativa.

Física

O primeiro modelo mental que pode ser útil no mundo dos investimentos é o da Física. Se você entende a lei da oferta e demanda, entende o princípio do equilíbrio, que é um dos conceitos fundamentais da Física.

Por terem assimilado a Física, economistas entendem que a natureza  —  e os mercados  —  têm como objetivo o equilíbrio e qualquer perturbação nesse sistema tende a ser temporária. Até a produtividade pode ser encarada como uma lei física: uma empresa tende a diminuir o ritmo de seu crescimento à medida que o ganho advindo da produção de uma unidade adicional diminui marginalmente, até atingir o ponto de equilíbrio.

Um investidor de ações pode perceber que oscilações nos preços de seus ativos são perturbações temporárias do mercado, mas que, a longo prazo, tenderão à média (ao equilíbrio) e refletirão o valor de geração de caixa na perpetuidade trazido a valor presente, com um desconto.

Biologia

“Equilíbrio pode mesmo ser o estado natural do mundo, (…) mas não é a condição constante sugerida pela Física newtoniana.”  – Robert Hagstrom

Os crash das bolsas de valores põem à prova a teoria dos mercados em equilíbrio. Daí, surge a importância da Biologia e o seu conceito de evolução. Se na natureza há a seleção natural, no mercado há a seleção econômica.

Claramente inspirados em Charles Darwin, vários economistas passaram a compreender a Economia como um processo evolutivo. Joseph Schumpeter chegou a cunhar a expressão “destruição criativa” para se referir ao processo natural do capitalismo, cujo equilíbrio é alcançado por adaptação, ou seja, inovação e empreendedorismo.

Sociologia

“Posso calcular o movimento dos corpos celestes, mas não a insanidade dos homens.”  – Sir Isaac Newton

O mercado é composto por grupos de homens e, até que compreendamos o comportamento de grupo, não poderemos entender completamente como os mercados funcionam. A sociedade, governos e a bolsa de valores podem ser estudados como sistemas complexos e adaptativos, ou seja, conjuntos grandes e dinâmicos compostos por vários agentes que adaptam as suas ações com base tanto nas interações entre si quanto com o sistema como um todo.

Dito de outra forma, o mercado pode ser racional ou irracional dependendo de algumas circunstâncias. Se ele tiver grande diversidade de participantes, e mais importante, independentes, então será eficiente; mas, se as informações no mercado forem deficientes ou as pessoas tomarem decisões baseadas em terceiros, surgirá o “efeito manada”.

E como compreender como as pessoas tomam decisões no meio de um sistema tão instável? A Psicologia pode ajudar.

Psicologia

Normalmente, as pessoas evitam riscos quando há esperança de ganho, mas adoram arriscar se há uma perda certa. Isso se dá porque o sofrimento com uma perda é maior do que a alegria com um ganho do mesmo valor.

Outra ideia-chave é que buscamos conforto mental. Por isso, mesmo sabendo que os especialistas do mercado não podem prever o comportamento da bolsa do dia seguinte, nós gostamos de acreditar neles. Diz Hagstrom: “quando tomamos decisões de investimentos, nosso comportamento é, por vezes, errático, frequentemente contraditório e ocasionalmente patético”. Por isso, compreender a irracionalidade humana é fundamental para o investidor.

Filosofia

“O mundo que vemos é definido e tem significado por nossa escolha de palavras.”  – Ludwig Wittgenstein

Ter a Filosofia como modelo mental é colocar-se no caminho do pensamento crítico. Podemos então observar as coisas por outros ângulos ou abordar os investimentos como um conjunto de narrativas.

O modelo mental filosófico nos ajuda a reconhecer os diversos padrões que existem na bolsa de valores. A Amazon, por exemplo, passou anos sendo alvo de discussões acaloradas entre entusiastas e pessimistas. Os pessimistas viam a Amazon como uma livraria online e a comparavam com o Walmart, logo as ações estavam caras. Já os que tinham a mente aberta para uma nova história sendo contada comparavam a Amazon com a Dell, portanto, suas ações ainda poderiam se valorizar. Hoje, sabemos quem tinha razão.

A Filosofia também nos fornece o pragmatismo, segundo o qual as pessoas não podem ficar presas a preconceitos ou dogmas. O investidor pragmático não confia em ideias abstratas ou leis econômicas, mas nos retornos de seus investimentos.

Literatura

“Escolher investimentos cuidadosamente requer as mesmas habilidades mentais de uma leitura atenta de livro.”  – Robert Hagstrom

Não se trata de ler um calhamaço de livros, mas de ler bem. Ler bastante, mas de forma crítica  —  fazendo conexões com leituras anteriores. O autor Mortimer Adler, em Como ler livros, propõe que o bom leitor tenha em mente as seguintes questões: 1º Sobre o que é o livro? 2º O que está sendo dito em detalhes? 3º O livro é verdadeiro no todo ou em parte? 4º “E daí?”.

O investidor que é um bom leitor se torna mais inteligente de maneira geral e isso pode ajudá-lo a ter uma mentalidade crítica  —  separando fatos de opinião. Isso é fundamental quando o seu dinheiro está em jogo.

Matemática

Neste capítulo, o autor examina diversos conceitos matemáticos, necessários a um investidor: cálculos de descontos sobre fluxo de caixa, variâncias, teoria da probabilidade, regressão à média e incertezas frente ao risco; mas importa resumir a ideia-chave: o bom investidor baseia-se em boa matemática.

Mensurar o fluxo de caixa, calcular probabilidade para preservar patrimônio, entender que média não reflete a variância do mercado. Com esse modelo mental, o investidor poderá aumentar suas apostas sem se expor aos riscos de cauda e, após vários anos, terá um belo patrimônio acumulado.

Conclusão

Para Robert Hagstrom, a lição do livro é que o comportamento do mercado não pode ser explicado unicamente com teorias financeiras, mas com toda a “sabedoria mundana”  —  mais próxima dos períodos medievais do que da educação dos dias de hoje.

Hoje, falta-nos uma educação abrangente, pois as escolas são boas em ensinar fatos, mas não estimulam a conexão entre eles. O acúmulo de conteúdos ou um QI alto não são garantias de sucesso profissional ou pessoal, mas o resgate das artes liberais pode preencher lacunas  —  inclusive do mundo dos investimentos  — , tornando-nos mais sábios, felizes e… próspero$.

 

Tiago Pedreiro de Lima é major do Exercito Brasileiro

 

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