O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou o pedido da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, que queria arquivar o inquérito contra o presidente Jair Bolsonaro no qual ele é investigado por um suposto vazamento de dados sigilosos. O caso apura se o chefe do Executivo federal divulgou, em 2021, um inquérito sigiloso da Polícia Federal (PF) sobre o ataque hacker contra o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nas eleições de 2018. “Não conheço dos pedidos de reconsideração e impugnação da Procuradoria Geral da Republica, por impertinentes e intempestivos. Publique-se e intime-se. Brasília, 5 de agosto de 2022”, diz o trecho final da decisão do magistrado.
Na segunda-feira (1º), Lindôra afirmou que Moraes havia violado o sistema acusatório ao ordenar novas medidas de apuração, apesar de um pedido anterior de arquivamento da Procuradoria-Geral da República (PGR), feito pelo procurador-geral, Augusto Aras. “Insta salientar que a violação ao sistema acusatório no caso concreto revela-se ainda mais grave, já que a decisão nula que decretou diligências investigativas ex officio foi prolatada após a promoção de arquivamento pela Procuradoria-Geral da República que vincula o Poder Judiciário, não podendo ser ignorada ou refutada como se verifica na espécie”, escreveu Lindôra. O recurso foi apresentado depois de o ministro Alexandre de Moraes mandar a PF concluir a análise dos dados do celular do ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Barbosa Cid. Homem de confiança do presidente, Cid teria participado da organização da live na qual o chefe do Executivo federal divulgou dados sobre a investigação sobre o ataque ao TSE.
Na decisão desta sexta-feira, Moraes destacou que a legislação possibilita “outras hipóteses” de investigações pré-processuais “sem a necessidade de qualquer autorização” do Ministério Público Federal. “À luz do sistema jurídico-normativo brasileiro, diferentemente do alegado pela ilustre Vice-Procuradora Geral da República, não se confunde a fase pré-processual (investigativa) com a titularidade da ação penal pública, cuja promoção, nos termos constitucionais, é privativa do Ministério Público, que, como dominus litis, deve formar sua opinio delicti a partir das provas obtidas na investigação; sem contudo possuir atribuição constitucional para obstar ou impedir a atividade da Polícia Judiciária”, escreveu o magistrado.
Em outro trecho, o ministro afirmou que em quatro oportunidades anteriores a vice-PGR se manifestou a favor de decisões anteriores tomadas por ele sobre a necessidade de coleta de provas sobre o caso. “Em quatro das cinco oportunidades de atuação do Ministério Público, a Procuradoria Geral da República manifestou-se por meio da Dr. Lindôra Maria Araújo, Vice-Procuradora Geral da República, que, por meio de sua ciência, concordou com as referidas decisões, inexistindo a interposição de qualquer pedido de reconsideração, impugnação ou recurso no prazo processual adequado. A inusitada alteração de posicionamento da Procuradoria Geral da República, manifestada somente em 1º de agosto de 2022, não afasta a preclusão temporal já ocorrida, pois não tem o condão de restituir o prazo processual para interposição dos recursos no prazo legal”.
Em relatório de novembro do ano passado, a Polícia Federal afirma que Bolsonaro teve “atuação direta, voluntária e consciente” na prática de crime de violação de sigilo funcional. “Este inquérito permitiu identificar a atuação direta e relevante do Exmo. Sr. Presidente da República Jair Messias Bolsonaro na promoção da ação de desinformação, aderindo a um padrão de atuação já empregado por integrantes de governos de outros países”, escreveu a delegada Denisse Ribeiro.
“Os elementos colhidos apontam também para a atuação direta, voluntária e consciente de Filipe Barros Baptista de Toledo e de Jair Messias Bolsonaro na prática do crime previsto no artigo 325, §2°, c/c 327, §2°, do Código Penal brasileiro, considerando que, na condição de funcionários públicos, revelaram conteúdo de inquérito policial que deveria permanecer em segredo até o fim das diligências (Súmula nO 14 do STF), ao qual tiveram acesso em razão do cargo de deputado federal relator de uma comissão no Congresso e de presidente da república, respectivamente, conforme hipótese criminal até aqui corroborada”, diz outro trecho do relatório.
No documento, Ribeiro pediu o indiciamento do ajudante de ordens Mauro Cid pelo crime de violação de sigilo funcional. “Determino: O indiciamento de MAURO CESAR BARBOSA CID pela prática do crime previsto no artigo 325, §2°, c/c 327, §2°, do Código Penal brasileiro, considerando que, na condição de funcionário público, revelou conteúdo de inquérito policial que deveria permanecer em segredo até o fim das diligências (…), ao qual teve acesso em razão do cargo de Chefe Militar da Ajudância de Ordem da Presidência da República, conforme hipótese criminal até aqui corroborada”. A delegada disse, à época, que não pediu o indiciamento de Bolsonaro e do deputado Filipe Barros porque decisões recentes do Supremo apontaram que pessoas com foro privilegiado só podem ser indiciadas mediante autorização prévia da Corte.
Com Jovem Pan