(Carlos Graieb, publicado no portal O Antagonista em 15 de março de 2023)
A consultoria Quaest divulgou nesta quarta-feira (15) uma pesquisa feita com 82 economistas, gestores de fundos de investimento e analistas de mercado. O propósito era medir a percepção desse grupo sobre a condução da economia no governo Lula. 98% dos entrevistados disseram que a economia está no caminho errado e 94% disseram que não confiam no presidente. Eita! Mas não chega a ser uma surpresa.
Diante desses resultados, Lula e o PT podem reagir como sempre. Podem dizer que o mercado é inimigo do povo, que o Brasil é dominado por rentistas a quem interessa manter os juros nas alturas, que é preciso combater a ditadura financeira ou o neoliberalismo – e assim por diante. Um dos dados da Quaest pode encorajar o PT a escolher esse caminho populista: 62% da opinião pública acha que a economia vai melhorar nos próximos 12 meses. A situação se inverte quando a mesma pergunta é feita a quem lida com os números no dia a dia: 78% dos profissionais do mercado acreditam que a tendência é de piora.
Mas há um outro modo de ler a pesquisa, se Lula tiver boa vontade para tanto. Ela mostra que há pontos de contato entre as agendas do mercado e do governo, e que com pouco esforço é possível não apenas reduzir a desconfiança em relação à política econômica, mas também alcançar resultados práticos que Lula deseja ardentemente, sem que haja resistência. Fiquemos no exemplo da redução da taxa de juros.
A esmagadora maioria dos profissionais do mercado ouvidos – 91% – acredita que os juros vão cair se o governo apresentar um arcabouço fiscal crível. Além disso, segundo 49%, a aprovação da reforma tributária também pode contribuir com esse objetivo (só 4% acham que não haveria impacto algum).
Tanto a nova regra fiscal quanto a reforma dos tributos foram promessas do PT durante a campanha eleitoral. Não são agendas que lhe tenham sido impostas pelo “capitalismo financeiro internacional” ou qualquer outro espantalho. O que houve de surpreendente neste começo de governo foi a decisão de Lula de deixar em segundo plano essas pautas consensuais e mirar na jugular de Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, em busca de uma redução das taxas de juros na marra.
É tolice imaginar que um dia o mercado financeiro e o PT vão cair de amor um pelo outro. Mas esses números altíssimos de ceticismo e desconfiança captados pela pesquisa Quaest são resultado de feridas que Lula infligiu a si próprio.
Vejamos a opinião do mercado sobre Fernando Haddad, o ministro da Fazenda, que esbraveja menos sobre juros e fala mais sobre arcabouço fiscal e reforma tributária: 52% qualificam seu trabalho como regular e 38%, como ruim. Os resultados são bem menos trágicos. Se houvesse a percepção de que Haddad conta com o respaldo incondicional de Lula e não é alvo permanente da sabotagem do PT (de Gleisi Hoffimann em especial), o humor com a economia provavelmente seria outro.
Lula tem duas opções. Ele pode continuar sendo o político marrento para quem não existe outro caminho senão se contrapor sem trégua a esse monstro, “o mercado”. Ou ele pode olhar os números da Quaest e concluir que a criação de um bom arcabouço fiscal e a aprovação de uma boa reforma tributária são objetivos compartilhados por gente que, à esquerda e à direita, quer ver a economia melhorar. Não parece ser uma escolha difícil.