(J.R. Guzzo, publicado no jornal Gazeta do Povo em 18 de dezembro de 2023)
O Ministério dos Direitos Humanos considera que existem dois tipos diferentes de brasileiros, e trata cada um deles de maneira também diferente. Uns são seres humanos – condição que só pode ser adquirida por quem dispõe de alguma identificação como “pessoa de esquerda”. Os outros são “bolsonaristas”. É uma maldição que atinge todos os cidadãos que não gostam do presidente Lula, nem do seu mundo, e não votaram nele nas últimas eleições. Estes, para o Ministério dos Direitos Humanos e para o governo Lula em geral, não têm direitos humanos ou de qualquer outro tipo – nem os que sã previstos na legislação de proteção aos animais.
Países que se dão ao trabalho, e à despesa, de manterem ministérios de direitos humanos assumem compromissos concretos com as prerrogativas legais de todas as pessoas, sem fazer distinções baseadas em suas atitudes políticas. Se não for assim, nem pensam em ter ministério nenhum para cuidar do assunto. O Brasil é um caso único. Tem ministério, ministro, carro oficial e o resto da procissão, mas é contra a ideia geral de que todos os seres humanos são iguais e têm direitos inalienáveis que recebem ao nascer.
Aqui, como se comprova pela atuação concreta do MDHC (cabe a ele a “Cidadania”, também), os cidadãos até podem nascer iguais, mas vão ficando diferentes à medida que escolhem suas posturas políticas e seus estilos de vida. Se não entram no “campo progressista” são lançados no rol dos culpados “bolsonaristas” – e aí não têm direitos, ou só têm os direitos que o STF quiser.
Há quase um ano o MDHC assiste sem fazer a mínima objeção a aquilo que talvez seja a mais evidente violação em massa dos direitos humanos ora em andamento em qualquer lugar do mundo – os processos do “Oito de Janeiro” feitos pelo STF. Os réus não poderiam estar sendo julgados ali. Há acusados primários que estão presos há onze meses, sem julgamento e sem culpa formada. O ministro Alexandre de Moares se nega, repetidamente, a atender pedidos do Ministério Público para que presos com problemas urgentes de saúde sejam atendidos em hospitais. Um deles morreu há pouco no pátio da penitenciária; outro acaba de tentar o suicídio. Pessoas estão sendo condenadas a até 17 anos de prisão por terem participado de um quebra-quebra. Os advogados não têm o pleno direito de defender os réus; não sabem, sequer, se suas demandas estão sendo vistas por alguém. O MDHC considera que nenhum tipo de direito humano está envolvido em nada disso.
O mesmo Ministério, porém, está dando apoio oficial a baderneiros de um partido de extrema esquerda que depredaram a Assembleia Legislativa de São Paulo na votação que aprovou (por 61 votos a 1) a privatização da empresa estatal de águas e esgoto. Dois deles foram recebidos no próprio MDHC, em Brasília, para se queixar da “violência” da polícia na tentativa de proteger o patrimônio público. Não houve violência nenhuma por parte dos policiais, conforme mostram imagens gravadas; quem fez o quebra-quebra foram os manifestantes. Já está tudo certo, é claro. Os quatro arruaceiros presos foram soltos. Os que visitaram o ministério foram descritos como “lutadores sociais”.
É o que poderia haver de mais coerente com um ministro de Direitos Humanos que é contra um projeto de anistia – caso sem paralelo no planeta. Está, neste momento, na campanha “Sem Anistia”, que luta para bloquear projetos de perdão para os presos de Brasília. Tudo a ver, realmente.