(J.R. Guzzo, publicado no jornal Gazeta do Povo em 18 de abril de 2024)
O Brasil e os brasileiros sabem perfeitamente, há anos, que há censura à liberdade de expressão neste país, e que isso é ilegal – viola diretamente o artigo 5º da Constituição Federal. Não é possível recorrer à Justiça em busca de proteção contra esse desrespeito flagrante à lei e aos direitos constitucionais do cidadão, porque quem executa a censura é a própria Justiça. Mais. É o Supremo Tribunal Federal, nada menos que a instância máxima do sistema judicial brasileiro – de modo que a pessoa não apenas é censurada, mas não tem a quem recorrer.
Aqui dentro, portanto, não há o que fazer a respeito. Mas uma aberração dessas, mais cedo ou mais tarde, teria de vazar para o conhecimento do mundo exterior; o STF não podia esperar que as ilegalidades que pratica continuassem eternamente desconhecidas fora do Brasil. Acabou vazando, é claro.
O primeiro problema estourou na Comissão de Justiça da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos, onde o STF em geral, e o ministro Alexandre de Moraes em particular, acabam de ser denunciados como infratores das leis e da Constituição do seu próprio país. Nunca tinha acontecido nada como isso. A lembrança mais parecida é o entrevero em torno do desrespeito aos direitos humanos no Brasil, durante o regime militar.
O governo americano cobrou e a ditadura militar brasileira ficou zangada – não podia admitir, segundo se disse na ocasião, “interferências estrangeiras” em “questões internas” do Brasil. Agora os deputados americanos estão expondo ao mundo a face oculta do regime brasileiro: uma ditadura judicial que persegue adversários políticos com censura, polícia, multas, bloqueio de contas bancárias e prisões.
O detonador disso tudo foi Elon Musk, o controlador do Twitter, com a desavença pública que teve com Moraes a respeito das pressões e decisões ilegais do STF para suprimir perfis e postagens da plataforma. Musk não é um dos perseguidos-padrão do ministro – é Elon Musk, e confrontos com ele não podem, simplesmente, ficar restritos ao Brasil. Não ficaram, é óbvio.
O proprietário do atual X, como o Twitter passou a ser chamado, foi solicitado pela Câmara americana a entregar informações sobre a censura sofrida pela plataforma por parte do STF. O resultado imediato foi a divulgação nos Estados Unidos, e daí para o mundo, de 88 decisões da Justiça superior brasileira ordenando a censura em perfis do X – cerca de 300 contas, incluindo as de deputados em exercício dos seus mandatos.
Nem o ministro Moraes nem o STF, é claro, serão afetados em nada. Contam, por sinal, com o apoio intransigente do governo, da extrema esquerda e de quase toda a imprensa brasileira para continuar fazendo o que fazem. A censura nas redes sociais, na verdade, é hoje uma das grandes causas ideológicas do “campo progressista”: a “democracia”, pregam eles em voz cada vez mais alta, está sendo ameaçada pela liberdade de expressão.
É indispensável, a seu ver, impor a censura ao Brasil – apresentada como “regulamentação” das redes sociais. Ali, segundo dizem, a liberdade estabelecida na Constituição está sendo “usada” para publicar “notícias falsas, desinformação e discursos do ódio”. Ninguém, aí, está interessado na verdade, na precisão e na virtude. O que querem todos eles, governo, STF e a esquerda, é calar as vozes dissidentes. Agora terão de fazer isso cada vez mais na frente de todo o mundo.