Eles podem estar certos e nós, errados. E isso é muito bom!
(Paulo Polzonoff Jr., publicado no jornal Gazeta do Povo em 23 de agosto de 2024)
Caro leitor,
Você conseguiu ver as imagens do almoço que o STF organizou para articular uma pax brasiliana entre o Judiciário, Legislativo e Executivo? Imagens de tirar o apetite, indigestas e nauseabundas, diga-se de passagem. Eu vi e ri (de nervoso) e fiquei com raiva e indignado e até um pouquinho deprimido. Até me dar conta de que eles… estão certos.
“Como assim, Paulo? Você reinaldoazevedou* agora?”, me pergunta o leitor, espero que tirando uma com a minha cara. Não, não é nada disso. Mas para entender como cheguei a essa brilhante e consoladora conclusão é preciso voltar um pouquinho no tempo. Só uma semaninha. Pode configurar o capacitor de fluxo, soltar a névoa artificial, tremer a imagem e.
O óbvio que ulula
Semana passada, quando por um instantezinho pareceu que o mundo cairia sobre a cabeça de Alexandre de Moraes, uns e outros capangas fieis ao tiranete de toga se apressaram em sair em defesa dele. Com aqueles argumentos que a gente está cansado (e eu estou careca) de saber: ataque às instituições democráticas, descredibilização do Judiciário, foi necessário para deter o ímpeto golpista. Coisa e tal.
No meio disso tudo, um bom amigo me perguntou assim meio a sério e meio retoricamente: “Não é possível! Será que eles estão certos e nós estamos errados?”. Na hora a vontade foi responder que não, imagina!, que é isso?, eles estão muito errados e nós estamos muito certos, blá, blá, blá. O óbvio que ulula. Mas meus dedos velozes me surpreenderam ao darem vazão a uma epifania. Esta: “Eles estão certos, amigo. Os idiotas somos nozes” – escrevi e o corretor automático fez a piadinha infame.
Coisa de idiota
Agora explico para você que está per-plec-to: de um ponto de vista estritamente mundano, materialista e ateu, o que os ministros do STF, Lula e toda a extrema-esquerda fazem é certo – no sentido maquiavélico e consequencialista do termo. Eles lutam pelo poder, pelo prestígio e pelo dinheiro, e para isso instrumentalizam as pessoas e, agora, as instituições e até os conceitos democráticos. Eles dão nó em pingo d’água para saírem vencedores de qualquer situação. E oquei. Porque, se você parar para pensar, tudo isso faz um sentido danado quando o objetivo é conquistar o mundo. Este mundo.
Todas essas coisas fazem sentido, um sentido que não por acaso vou chamar de danado, quando se ignora completamente a Eternidade. Ou melhor, quando se ri da Eternidade, reduzindo-a a um delírio supersticioso de fanáticos. Quando a única imortalidade que se almeja é aquela do Drácula. E pode ter certeza: já convivi o bastante com esse tipo de gente para saber que a mentalidade esquerdoprogressista vê assim a ideia de transcendência: como coisa de idiota.
Esperteza
Claro que se trata de uma aposta arriscada, a deles. Que estão trocando a salvação ou a danação eternas por umas poucas décadas de poder, prestígio e dinheiro. Por salamaleques e rapapés do mundo. Ora, mas essa não é a tentação suprema (sem trocadilho) que todos um dia enfrentamos? Uns a rejeitam de imediato; outros hesitam; e outros a ela se entregam de corpo e alma. Mais alma do que corpo.
E infelizmente a imensíssima maioria da elite que nos governa (inclusive na iniciativa privada) pertence a esse segundo grupo: o dos que cederam à tentação e trocaram a honra, a decência e o Amor pela “esperteza” de terem o controle sobre suas próprias vidas e a dos demais. Pela mentira de que podem ser deuses.
Um abraço e, se sair de casa, leve um casaquinho, hein?!
Paulo
* Reinaldo Azevedo que, de acordo com a lógica do texto, também está certo. Certíssimo.