Da Redação
O governo Lula (PT) assinou neste ano aditivos contratuais que favorecem a empreiteira Engefort, alvo de acusações de irregularidades detectadas pela Controladoria Geral da União (CGU) e indicada em auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) como a líder de um cartel que teria fraudado licitações de pavimentação no total de mais de R$ 1 bilhão de 2018 a 2021. A informação é do jornal Folha de S. Paulo.
Esses aditivos, por meio da estatal federal Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), tratam principalmente da prorrogação ou “reinício” de 12 contratos cujos valores originais somam cerca de R$ 180 milhões para obras nos estados de Amapá, Bahia, Ceará, Paraíba, Sergipe e Tocantins.
Dois desses contratos do Amapá já foram atacados por fiscalizações do TCU e da CGU. Os auditores encontraram nas obras desvios, superfaturamentos e falta de projeto, entre outras irregularidades. Apesar disso, agora sob Lula, um desses contratos teve seu valor aumentado e seu prazo prorrogado em 2023. Outros contratos foram estendidos apesar de ainda não terem saído da estaca zero.
Além das irregularidades nos contratos aditivados, o TCU e a CGU já apontaram irregularidades graves em várias outras obras da Engefort, levando a própria Codevasf a abrir procedimentos internos. A estatal já afirmou que suas apurações podem levar a pedidos de ressarcimento à Engefort. No Maranhão, por exemplo, as acusações são de desvios com “sarjetas fantasma” nas obras.
Presidente da estatal desde 2019, indicado pelo líder da União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento (BA), o engenheiro Marcelo Moreira foi mantido pela gestão Lula no cargo. O novo governo promove mudanças em diretorias e nas superintendências estaduais para conseguir apoio no Congresso Nacional.
Segundo a Folha, a Engefort, construtora maranhense sediada em Imperatriz (a 630 Km de São Luís), chegou a dominar licitações de pavimentação da Codevasf, muitas vezes participando sozinha ou na companhia de uma empresa de fachada.
A maior parte dos contratos da estatal com a empreiteira foi abastecida por emendas parlamentares. Três das obras que receberam aditivos em 2023, orçadas em R$ 90 milhões, foram indicadas pelo senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), aliado de Lula.
Em um dos casos que envolveu emendas de relator de autoria de Alcolumbre, técnicos do TCU já chegaram a apontar inclusive direcionamento pelo congressista em favor da Engefort.
Em ofício que enviou à estatal no qual escolheu as cidades a serem beneficiadas e o tipo de pavimento que elas receberiam, Alcolumbre anexou até uma planilha com o timbre da construtora. A construtora também já fez uma reunião na Codevasf com Alcolumbre, sem registro em ata.
Em relatório divulgado neste ano, a CGU afirmou que ainda não havia definição sobre quais ruas seriam pavimentadas em duas destas obras apadrinhadas por Alcolumbre, cerca de dois anos após a assinatura dos contratos. Além de atrasos, a controladoria aponta sobrepreço (R$ 1,4 milhão), superfaturamento (R$ 592,5 mil) e outros prejuízos no valor de R$ 1,9 milhão, como em falhas no dimensionamento das pavimentações. Ou seja, irregularidades de cerca de R$ 3,9 milhões.
Um dos contratos para o Amapá foi assinado em 2021 e recebeu três aditivos no governo Lula, em janeiro, fevereiro e abril.
Ao fim do governo Bolsonaro, o contrato tinha valor de aproximadamente R$ 28,8 milhões, mas, com os aditivos assinados em janeiro e abril, o montante subiu para cerca de R$ 29,2 milhões. Já o adendo de fevereiro prorrogou o prazo do contrato em dez meses.
Dos 12 contratos que receberam aditivos, ao menos quatro têm 0% de execução, segundo informações da Codevasf.
O site da Codevasf não mostra dados sobre duas obras. Uma delas, no Ceará, também virou alvo da CGU. O órgão afirma que o orçamento desse contrato de R$ 18,45 milhões inclui serviços de R$ 7,2 milhões que não serão feitos, como o destocamento de árvores.
Depois de a Folha mostrar a que a Codevasf trouxe para dentro da gestão Lula empresas e práticas investigadas por órgãos de controle, a Secom (Secretaria de Comunicação Social) publicou uma nota no site “Brasil contra fake” afirmando que o governo não está “envolvido” com o “cartel do asfalto”.
Questionada pela Folha sobre a Codevasf ter ampliado contratos com a Engefort mesmo após ressalvas de órgãos de controle, a Secom não se manifestou.
Já a Codevasf afirmou que “os aditivos mencionados referem-se a dilatações de prazo”, para assegurar “a continuidade da prestação de serviços e o emprego efetivo de recursos orçamentários já empenhados”. A estatal negou que tenha ocorrido aumento do valor de um dos contratos do Amapá por meio de aditivo.
Em nota enviada à Folha, a Engefort afirmou que repudia “veemente quaisquer alegações de indícios formação de cartel, conluio e fraude existentes nos certames licitatórios em que participou” e “não compactua com quaisquer ilicitudes”.
O senador Davi Alcolumbre afirmou que espera que os órgãos de controle “exerçam sua missão nos processos instaurados para fiscalizar as denúncias de irregularidades”.