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Desconto de R$ 6,8 bilhões em acordo de leniência dos irmãos Batista gera crise no MPF

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Da Redação

 

A revisão do bilionário acordo de leniência do grupo J&F abriu uma crise interna no Ministério Público Federal (MPF). Um dos maiores da História, o acordo de leniência da empresa dos irmãos Batista, que previa o pagamento de multa de R$ 10,3 bilhões ao longo de 25 anos por conta do envolvimento em casos de corrupção nos governos petistas de Lula e Dilma Rousseff, teve agora seu valor reduzido, monocraticamente, por um procurador que teve seu voto vencido em colegiado. A informação é da coluna de Malu Gaspar, do jornal O Globo.

O procurador Ronaldo Albo, da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (MPF), reduziu de R$ 10,3 bilhões para R$ 3,5 bilhões a multa que a J&F aceitou pagar em acordo de leniência assinado livremente em 2017. O desconto de R$ 6,8 bilhões corresponde a mais de 65% da multa e foi concedido de maneira questionável em maio.

Segundo O Globo, o procurador Carlos Henrique Martins Lima, responsável pelo processo da J&F, já questionou a decisão.

O pedido de revisão do acordo já tinha sido feito pela J&F e negado pelo MPF anteriormente. Pelo acordo inicial, a empresa deve pagar R$ 10,3 bilhões em 25 anos, e o dinheiro seria destinado ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), à União, à Funcef e à Petrobras, além de mais duas cotas de R$ 500 milhões, uma para a Caixa Econômica Federal e outra para o Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS). Além disso, R$ 2,3 bilhões seriam reservados para a execução de projetos sociais.

Com a decisão de Albo, responsável pelo órgão do MP que analisa casos de combate à corrupção e improbidade administrativa (a 5ª Câmara), o novo valor, de R$ 3,5 bilhões, seria pago em cinco anos e destinado unicamente à União. A Justiça Federal de Brasília ainda não homologou o acordo chancelado por Albo.

Em uma petição, o procurador Lima alega que, para atender os irmãos Batista, Albo passou por cima decisão anterior, que negou a repactuação da multa, e atropelou o voto de dois outros subprocuradores que também já haviam recusado o pleito da empresa por um placar de 2 a 1 na própria Câmara.

Em abril do ano passado, Lima já tinha negado um pedido da J&F, ao argumentar que não havia justificativa plausível para reduzir a multa.

Agora, no recurso contra a decisão de Albo, o procurador lembra que “o acordo de leniência foi firmado voluntariamente pela holding, que permanece em atividade e, diga-se, com saúde financeira superior à que tinha à época de sua celebração”.

Lima também afirma que o MPF cumpriu com todas as obrigações que lhe cabiam e que o caso já esgotou todas as possibilidades de recurso. “Inexiste qualquer fato novo que justifique novo pedido de repactuação”, escreve o procurador.

O recurso de Lima é para a própria 5ª Câmara. Caso Albo não reveja a repactuação da multa, o procurador Carlos Henrique Martins Lima pretende levar a controvérsia para o Conselho Institucional do MPF, que julga recursos contra decisões das câmaras. O conselho é presidido pela vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo.

No recurso, o procurador relata pelo menos dois fatos atípicos no pedido da J&F e na condução dada pelo colega. Lima diz que, embora fosse ele o procurador responsável pelo caso, o grupo J&F conseguiu acionar a 5ª Câmara, onde o caso parou nas mãos de Ronaldo Albo. “Referido procedimento, além de veiculado no local inadequado, correu à revelia deste procurador natural do caso, o qual não teve ciência dos atos ocorridos, menos ainda participação no julgamento”, relata Lima.

O segundo fato citado por Lima foi que Albo colocou o caso em pauta em 25 de maio, quando um dos três integrantes da 5ª Câmara estava de férias. Eitel Santiago, pego de surpresa com a pauta, pediu vista (mais tempo para analisar), e o processo foi suspenso. Quando o procurador Alexandre Camanho voltou de férias, ele queria votar, pedido que foi inicialmente negado por Albo. No fim, ele acabou cedendo. E o placar ficou em dois a um: apenas Albo votou para reduzir a multa.

Entretanto, depois disso, o procurador Albo acatou um recurso da J&F e, sem consultar os colegas, anulou o voto contrário de Camanho e autorizou a redução da multa à J&F. Para Albo, com o placar empatado em um a um, seu próprio voto de relator e presidente da Câmara deveria prevalecer. Dessa forma, o procurador autorizou o desconto de R$ 6,8 bilhões à J&F.

Ao jornal O Globo, procuradores afirmaram, reservadamente, que estranharam a decisão de Albo. “Um ministro da Fazenda não consegue isentar uma empresa em R$ 7 bilhões, mas o doutor Ronaldo está tentando”, disse um procurador.

Integrantes da Procuradoria-Geral da República (PGR) consultados reservadamente pela equipe do jornal concordam com esse entendimento. “E também não se pode anular, monocraticamente, decisão colegiada, ainda mais quando quem faz é quem ficou vencido.”

Lima, no recurso para anular a repactuação da multa, afirma que “não está dentre as atribuições do relator a previsão de poderes para rever monocraticamente decisão do colegiado, tomada por maioria de votos, em sessão encerrada”.

O procurador também afirma que a decisão de Albo causa um “inquestionável e severo prejuízo” aos órgãos que seriam beneficiados pelo acordo original, que “deveriam ter participado de eventual procedimento de repactuação”.

Ronaldo Albo ainda não se pronunciou sobre a decisão que beneficia a empresa dos irmãos Batista. A J&F afirmou que o caso está sob sigilo e não vai se manifestar.

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