Da Redação
A Defensoria Pública de Mato Grosso (DPMT) protocolou ação civil pública, com pedido liminar, na Vara da Infância e Juventude de Campo Verde (134 km de Cuiabá) solicitando que a Unimed suspenda todas as cobranças de coparticipação abusivas para atender crianças e adolescentes autistas com terapias multidisciplinares. De acordo com a ação, a cobrança também deve deixar de constar na fatura de dezembro de 2023. Caso a Justiça acate o pedido e a prestadora o descumpra, a Defensoria pede multa de R$ 10 mil para cada segurado prejudicado.
A defensora pública que assina a ação, Tânia Vizeu, também pede que, por danos morais coletivos, a prestadora de serviço de saúde pague o valor de R$ 100 mil; que não encerre os contrato com as famílias e que as crianças e adolescentes autistas de Campo Verde, que contratam a Unimed, recebam tratamento multidisciplinar integral, tais como terapias de Análise do Comportamento Aplicada (ABA) e Ayres, segundo prescrição médica e sem limites na quantidade das sessões.
Tânia ainda solicita que a prestadora seja a responsável por comprovar que os clientes não têm direito legal aos procedimentos, que o processo tenha prioridade na tramitação, já que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) assegura a prioridade às crianças e adolescentes e que as famílias sejam isentas do pagamento das custas processuais.
A ação foi protocolada em favor das mais de 100 famílias que integram a Associação de Deficientes de Campo Verde (AME). Mas, coletivamente, se estende a todos os moradores do município que enfrentam o mesmo problema com a Unimed, a Unimed Cuiabá e a Unimed Rondonópolis, empresas colocadas nominalmente como partes no processo.
“Ao todo, 15 famílias nos procuraram garantindo que desde o ano passado não conseguem ter ou manter o tratamento continuado de seus filhos. E um agravante é que essa atenção tem faixa etária definida para ter resultado eficaz no desenvolvimento cognitivo dessas crianças e adolescentes e mais, ele está definido na Resolução 469/2921 da Agência Nacional de Saúde (ANS), como sendo de prestação continuada e sem limite de sessões. Se não há mais limitação no número de sessões para o tratamento para pacientes autista, resta evidente que não se pode mais cobrar coparticipação por sessão realizada”, argumenta.
A defensora lembra que a “onerosidade excessiva e ilegal dos contratos” obriga as famílias a desistirem do tratamento prescrito pelo médico ou a ficarem endividadas, quando não encontram alternativas para o pagamento do mínimo necessário. A limitação no tratamento, gera piora no comportamento e vida social das crianças e adolescentes, crises nervosas por incapacidade de lidar com emoções, hipersensibilidade a sons, por exemplo, e queda na saúde emocional e qualidade de vida.
Caso Concreto
Uma das mães que figura no processo, Ludimila dos Santos, comprova que o valor mensal do plano de saúde de sua filha foi de R$ 207, no mês de outubro de 2023. Já o valor da coparticipação chegou a R$ 2.026, após 26 atendimentos terapêuticos, um atendimento de pronto socorro e um de terapia ocupacional. A defensora pontua que o Código de Defesa do Consumidor, no artigo 47, prevê que as cláusulas contratuais devem ser interpretadas de modo mais favorável ao consumidor.
“A respeito das cláusulas contratuais, importa registrar que, em que pese a possibilidade da cobrança a título de coparticipação aos consumidores dos planos de saúde, referida imposição não pode constranger o consumidor a cobrança excessiva que inviabilize o tratamento das crianças e adolescentes ou que caracterize financiamento integral”, argumenta.
Tânia registra também que, nos casos concretos dos pais que procuraram a Defensoria, a maior parte dos rendimentos da família são destinados ao pagamento da coparticipação do plano de saúde. “Sem falar naqueles que deixam de realizar tratamentos e os que mobilizam toda a família, pedindo doações e realizando empréstimos, gerando situação de hipossuficiência financeira, o que só incrementa o grau de vulnerabilidade gerado pelo próprio transtorno”, diz em trecho da ação. Com base em todas as repercussões sociais, legais e de saúde, a defensora pede que as cobranças ilegais e abusivas sejam suspensas.
TEA
O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) afeta o desenvolvimento neurológico, e é caracterizado por dificuldades de comunicação e interação social e pela presença de comportamentos ou interesses repetitivos ou restritos. Esses sintomas caracterizam o núcleo do transtorno, mas a gravidade de sua apresentação é variável. Os tipos de autismo englobados na ação são os de CID 11, que abrangem nove tipos caracterizados como 6A02 e suas subcategorias.
Os tratamentos multidisciplinares que resultam em respostas nesses pacientes envolvem acompanhamento de fonoaudiólogo, psicóloga, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta e outros, como o uso da técnica de integração sensorial de Ayres, aplicada há mais de 40 anos, com base em estudos de neurociência, biologia, educação, psicologia e terapia ocupacional e que, como a ABA, é prescrita por médicos no tratamento pelos bons resultados.
O TEA é frequentemente associado a outros transtornos psiquiátricos: do deficit de atenção, hiperatividade, depressão e ansiedade. E a outras condições médicas como epilepsia e transtornos genéticos, o que amplia as dificuldades motoras dos pacientes e as dificuldades das famílias. “Quando é detectado qualquer atraso, a estimulação precoce é a regra. Retardar a estimulação significa perder o período ótimo de estimular a aquisição de cada habilidade da criança, por isso, a urgência em solucionar a situação dessas famílias”, assegura a defensora.