Um ex-funcionário do Mercado Extra em Mongaguá, no litoral de São Paulo, afirmou ao g1 que o estabelecimento reembala e recoloca à venda carnes, frios e embutidos com a validade vencida. Nas imagens, gravadas em 11 de março, o profissional mostra produtos vencidos sendo retirados da embalagem original, colocados em uma nova embalagem e passando pelo processo de vácuo para, em seguida, receber uma nova etiqueta e retornar à venda.
O profissional, que preferiu não se identificar, disse que trabalhou durante dois anos na unidade e foi demitido em outubro deste ano. “Desde que entrei o procedimento é esse, reembalar produtos vencidos, lavar a carne e linguiça vencida para ser consumido”.
Ele ressaltou que isso chegou a prejudicar até a saúde dele. “Sempre fui contra esses procedimentos deles, mas tem situações em que você fala não e eles te dão advertências e, na situação em que nós estamos de emprego, a gente acaba acatando até o momento em que não aguentei mais”.
De acordo com o ex-funcionário, os produtos são lavados em água corrente. “Por que eles não descartam? Cada chefe tem um percentual de descarte que eles têm que cumprir, eles fazem de tudo para não descartar e não ser cobrado. Cada setor tem o seu macete para não descartar produto, essa que é a real”.
Ele disse que as carnes são lavadas até perderem o odor. “Quando a carne vem pronta, principalmente, a vácuo, a partir do momento que você abre a [embalagem] a maturação é muito rápida porque tem produtos dentro dessas embalagens que mantém o alimento sem estragar. Só que quando você corta esse saco, perde o conservante e a carne, linguiça, qualquer produto ao pegar contato com o ar, matura muito rápido, então como o Extra precisa vender, se não vende a tempo, eles pegam essa carne que já está vencida e faz a bandeja”, explicou.
O estabelecimento realiza um procedimento, chamado pique, que é o descarte de alimento vencido, de acordo com ele. “Todo departamento é obrigado a fazer o pique do dia. Cada setor tem o seu local apropriado de descarte, mas eles têm um controle e uma média do que pode descartar ou não. Só descarta aquilo que não tem como manipular, um iogurte não tem como pegar e alterar a data. Outros produtos que você consegue manipular a data são reaproveitados até perceber que não dá pra reutilizar”.
“As pessoas precisam saber os seus direitos. As pessoas têm que saber chegar no açougueiro e falar que ele não quer aquela carne, que quer que ele abra uma nova, mesma coisa com os laticínios, é um direito do cidadão. É onde mercados pequenos e grandes mercados se aproveitam para vender produto vencidos”, reforçou.
Ainda de acordo com o ex-funcionário, ele está com um processo contra o Extra, mas que não envolve as denúncias apresentadas nesta reportagem. Trata-se de questões trabalhistas envolvendo insalubridade, danos morais e horas extras que não foram pagos na rescisão.
Em outras imagens obtidas pelo g1, o ex-funcionário mostra linguiças em uma cuba junto à um pedaço de metal enferrujado, uma esponja e um pano. Segundo ele, o embutido estava ali para ser lavado e reembalado para ser vendido aos clientes.
Em nota, o Departamento de Vigilância Sanitária de Mongaguá afirmou que não recebeu denúncia sobre o caso, mas que encaminhará técnicos ao local para averiguar a situação.
O que diz a Lei
Ao g1, o advogado Fabrício Sicchierolli Posocco explicou que todo consumidor tem o direito básico à informação e como o produto foi acondicionado. “A identificação do conteúdo deve ser estampada na embalagem de forma clara e fácil linguagem. Essas informações precisam ter a data de fabricação, validade, modo de usar e até mesmo a composição”.
Segundo Posocco, em relação aos produtos fracionados, por exemplo, queijo, salame e carne, eles têm que conter na etiqueta, obrigatoriamente, a data em foram cortados, a marca, o prazo de validade e o responsável pelo fracionamento. “Tudo isso tem que estar bem claro. Muitas vezes as pessoas acabam fazendo um pouco de confusão. Você abre a embalagem original e a partir do momento que abriu ele vai perder o prazo de validade que foi informado pelo fabricante”.
Ele explicou que o correto é o estabelecimento fatiar o produto na frente do consumidor e replicar a nova etiqueta de validade no momento exato do corte. “É importante que o consumidor veja onde o produto está sendo partido. Tem que conferir a higiene do ambiente, verificar o lote do fabricante e todas as demais informações que só a peça inteira tem em detalhe. Esses direitos estão assegurados efetivamente no artigo 8º do Código de Defesa do Consumidor”.
Posicionamento
Em nota, o Extra informou que a rede repudia e proíbe qualquer prática que contrarie as normas e procedimentos relativos à qualidade e segurança alimentar previstos nas políticas da companhia e recomendadas pelos órgãos competentes.
Ainda de acordo com o Extra, um processo de investigação interno foi aberto para apurar a informação relatada e tomar as providências necessárias.